Está
representado essencialmente
por dois macroespaços:
1. Lisboa – espaço físico fulcral onde se
destacam outros microespaços como: o
Palácio
Real; o
Rossio (palco dos autos-de-fé,
espectáculos que desconstroem a autoridade da
Igreja pelo carácter lúdico e herético de que se
revestem); as ruas da capital (espaços onde o
povo oprimido e ignorante sofre e,
paradoxalmente, vibra com a desgraça dos seus
iguais e onde vive também as principais
celebrações do calendário religioso); a
Quinta do Duque de
Aveiro,
em S. Sebastião da
Pedreira,
nos arredores de Lisboa (espaço escolhido pelo
padre Bartolomeu para a construção da passarola,
espaço esse que escapa ao poder opressor da
Igreja e à rígida hierarquia social da época);
Odivelas,
em cujo convento vive a amante predilecta do rei
– a
madre Paula;
2. Mafra – espaço físico de construção do
convento, particularizado pelo alto da
Vela
– local escolhido para a construção do convento
- e a "Ilha da
Madeira" –
local onde se alojavam os 40 000 operários que
edificaram o convento.
Palácio-Convento de Mafra e respectiva tapada.
Nos arredores de Mafra, uma referência especial
para outras localidades, como
Pêro Pinheiro,
Monte Junto e
Serra do Barregudo.
Outros espaços surgem na obra, embora ganhem um
menor relevo:
*
Jerez de los Caballeros
*
Olivença
*
Montemor
*
Aldegalega
*
Morelena
*
Pegões
*
Vendas
Novas
*
Évora
*
Elvas
*
Coimbra
*
Holanda
*
Áustria…
ESPAÇO SOCIAL
É caracterizado por diferentes
atmosferas sociais e por vivências
protagonizadas por diversas personagens:
*
A vida no paço revela o código protocolar
das relações do casal real e de todos que o
rodeiam, em especial o clero.
*
As procissões (a procissão
de Penitência, pela Quaresma; a procissão dos
condenados da Inquisição) e a cerimónia de
inauguração da construção do Convento de Mafra ilustram a esfera de influência do clero na vida
social.
* As vivências do povo miserável e explorado
(João Elvas, Blimunda, Baltasar e sua família e
a massa anónima dos operários do convento)
recriam uma atmosfera que reflecte as
desigualdades do reino.
*
A intervenção do fantástico, de um certo
ar de magia, é conseguida pela presença de
superstições e de visionários, dos que vêem mais
longe do que os outros, dos que conhecem uma
verdade oculta à generalidade dos homens: Sebastiana de Jesus, uma mulher de sensibilidade
aguçada; Blimunda, "uma mulher que veio ao mundo
com o misterioso poder de ver o que há por trás
da pele das pessoas"; o padre Bartolomeu, porque
"inventou uma máquina capaz de subir ao céu e
voar sem outro combustível que não seja a
vontade humana"; Baltasar Sete-Sóis, o
complemento de Blimunda Sete-Luas, "porque está
escrito que onde haja um sol terá de haver uma
lua, e que só a presença conjunta e harmoniosa
de um e do outro tornará habitável, pelo amor, a
terra"; Domenico Scarlatti, com a arte musical
do seu cravo, modela o seu estado anímico e o
dos outros, nomeadamente cura Blimunda de uma
estranha doença.
*
Lisboa e Mafra, porque se ligam a todas as
situações supramencionadas, são espaços sociais
importantes.
*
Mas espaço social de relevância é
também o Alentejo, pois propicia um conhecimento
mais aprofundado da miséria e penúria por que então
passava o
povo - “por ser a fome muita nesta
província” (pág. 36). As menções ao Alentejo
evidenciam, ainda, um espaço povoado de mendigos
e salteadores, espaço esse que é percorrido por
Baltasar quando regressa da Guerra de Sucessão
de Espanha e, mais tarde, pelo cortejo real,
aquando do casamento de D. José e de D. Maria
Bárbara com os príncipes espanhóis.
*
Episódios e/ou percursos de personagens
que tipificam o espaço social e/ou um
determinado grupo social:
-
Procissão da Quaresma (págs. 28-30) –
apesar da tentativa de purificação dos excessos
cometidos durante o Entrudo, Lisboa permanece
suja, caótica, dominada pela hipocrisia das suas
gentes.
-
A miséria no Alentejo (págs. 35-36) – o
provo vive numa miséria arrepiante.
-
Autos-de-fé
(págs. 50-54) – intolerância, cinismo, jogos de
sedução, hierarquização dos condenados,
manifestações de sadismo - o povo,
obscuro e ignorante, diverte-se sádica e sensualmente com
as imagens da morte, esquecendo a miséria em que
vive. Paradoxalmente, é num dos autos-de-fé que
se dá o início da relação entre Baltasar e Blimunda,
uma relação pura e de amor vivido em plenitude …
-
Tourada, no Terreiro do
Paço (págs. 101-104) – ironicamente, o narrador
afirma que as pessoas não estranham o cheiro a
carne queimada e dá conta de actos de pura
violência perpetrados sobre animais (touros,
coelhos, pombas).
-
Procissão do Corpo de Deus (págs.
152-164) – desmistificação dos dogmas, crítica
irónica do narrador ao clero e à vida dissoluta
do rei com as freiras e histeria colectiva das
pessoas;
-
O trabalho no convento –
exploração indigna dos trabalhadores.
-
Cortejo real pelo Alentejo, em direcção a
Espanha (pág. 309 e seguintes) – luxo da corte
versus
miséria do povo e falperra de pedintes e
salteadores.
ESPAÇO PSICOLÓGICO
É
constituído pelo conjunto
de elementos que traduz a interioridade das
personagens (o "lugar" onde se geram os
conflitos, as lutas interiores, as emoções, os
anseios...), manifestando-se através dos sonhos,
dos devaneios e
dos respectivos pensamentos. Veja-se, a
título de exemplo, os devaneios eróticos da
rainha, quando sonha com o seu cunhado, o
príncipe D. Francisco, ou o sofrimento por que
passou Blimunda na sua longa demanda de
Baltasar.