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ATOS
ILOCUTÓRIOS - Tipologia

ASSERTIVOS |
O locutor assume, em maior ou menor grau, a
verdade ou a falsidade dos enunciados que
profere. Esses enunciados podem, portanto, ser
submetidos ao teste do verdadeiro ou falso.
Entram na categoria de assertivos verbos como
«afirmar», «sugerir» ou «colocar uma hipótese»,
distinguindo-se entre si pelo grau de
comprometimento do locutor.
Exemplos: Parto para a Austrália na próxima
semana; José Saramago foi Prémio Nobel da
Literatura em 1998; A Maria fez o almoço;
O dia amanheceu cinzento; Discordo.
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DIRETIVOS
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Nesta categoria incluem-se atos que demonstram
uma vontade ou desejo do locutor em levar o
interlocutor a realizar uma ação. Podem
traduzir-se em sugestões, ordens, avisos,
pedidos, perguntas (em que esteja subjacente a
ideia de pedido), etc. Por isso, atos como «convidar»,
«pedir»,
«requerer»,
«ordenar»,
«suplicar»
«obrigar»
ou «avisar»,
embora difiram pela natureza própria de cada um,
ilustram esta tipologia. É importante salientar
que, em relação a «obrigar»/«proibir», «ordenar»
e «querer», deverá
haver uma condição preparatória adicional
segundo a qual o locutor tem que estar numa
posição de autoridade em relação ao
interlocutor.
Exemplos: Quero esse trabalho terminado
dentro de meia hora; Venham passar o
fim-de-semana comigo a Lisboa!; Seria melhor
fazeres o exame; Despacha-te; O que
pensas deste assunto?; Queres vir à
festa?; Fechas-me a janela?
Os atos ilocutórios diretivos podem, pois,
basear-se em frases imperativas; em verbos
diretivos (aconselhar,
avisar, convidar,
esperar,
exigir,
implorar,
lembrar,
mandar,
obrigar,
ordenar,
pedir,
proibir,
querer,
requerer,
suplicar…);
em frases complexas com verbos de inquirição
como
perguntar,
interrogar,
inquirir,
investigar…;
e em simples interrogações ou perguntas. Estas
últimas inserem-se nesta subclasse, dado que
indiciam tentativas do falante para que o seu
interlocutor faça alguma coisa: dê uma resposta.
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COMPROMISSIVOS |
Atos que vinculam o locutor à realização de uma
ação futura que poderá afectar o interlocutor
de um modo positivo (no caso da promessa) ou de
um modo negativo (no caso da ameaça).
Os acos ilocutórios compromissivos podem
construir-se com base em verbos compromissivos (comprometer-se,
jurar, prometer, garantir, assegurar, afiançar,
tencionar…),
em frases simples com utilização do futuro ou
presente do indicativo; e em expressões
elípticas.
Exemplos:
Ligo-te amanhã. [Prometo que te ligo
amanhã.]; Eu vou; Prometo que
estudarei mais; Exijo um bom comportamento;
Encontro-te à saída.
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EXPRESSIVOS |
Expressam estados psicológicos do locutor
relativamente ao interlocutor e a um estado de
atitudes especificado. Assumem, muitas vezes,
valores judicativos e valorativos. Fazem parte
do paradigma destes atos verbos ilocutórios
expressivos como: «agradecer»,
«congratular-se»,
«adorar»,
«gostar»,
«lamentar»,
«deplorar»,
«odiar»,
«pedir
desculpa»,
«dar
boas-vindas»,
«apresentar
condolências»,
«felicitar»
…; expressões verbais com advérbios que criam
universos de referência, como «achar
bem»,
«achar
mal»
…; e expressões exclamativas com adjetivos
valorativos, advérbios e verbos experenciais,
expressivos ou afetivos.
O ato de «agradecer»
apresenta como conteúdo proposicional um ato
passado feito pelo interlocutor em benefício do
locutor que, por tal, expressa gratidão ou
apreço.
Exemplos: Lamento profundamente tudo o que te
aconteceu; Parabéns! A reunião correu bem!; Os
meus pêsames!; Estás linda!; Bom dia!
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DECLARATIVOS |
Atos de fala que criam um estado de coisas novo
pela realização simples de uma declaração –
dizer é fazer (criar a própria
realidade). Tal declaração altera o estado de
coisas envolvente: alguém fica baptizado, alguém
deixa de ser solteiro para assumir o estatuto de
casado, por exemplo.
Para que a realização dos atos declarativos
seja bem sucedida é necessário que o enunciado,
além de obedecer às regras linguísticas, surja
inscrito numa específica instituição
extralinguística, como a igreja, o tribunal, o
estado, dentro da qual o locutor e o
interlocutor desempenham papéis sociais
preestabelecidos (o padre perante os noivos, por
exemplo).
Frases ou expressões que atualizam os atos
declarativos constroem-se a partir de verbos
declarativos (declarar,
nomear, indigitar…)
e de frases declarativas.
Exemplos: «Baptizo este barco com o nome de...»;
«Declaro-vos
marido e mulher.»
(Só é uma declaração se o enunciado for
proferido pelo oficial de registos ou pelo
padre); «Está
aberta a sessão»
(É uma declaração, se o enunciado for proferido
pela pessoa que preside à sessão).
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DECLARATIVOS ASSERTIVOS |
Dentro dos atos declarativos circunscrevem-se,
numa classe autónoma, os assertivos que, como os
atos de declarar alguém inapto para o serviço
militar, ou alguém excluído de um concurso,
reúnem os objectivos ilocutórios de asserções e
de declarações. Nestes casos, o locutor, que
está investido de uma autoridade específica, é
responsável pela tomada de decisões, como as do
árbitro num jogo de futebol ou um chefe de
secção numa empresa, ou seja, o locutor, pelo
seu estatuto social ou profissional, está em
condições de criar uma nova realidade (como nos
atos declarativos ou declarações), mas surge
directamente implicado na verdade do enunciado
que produz.
Exemplos:
É a resposta do João que está certa. (É uma
declaração assertiva se o enunciado for
proferido, por exemplo, por um professor.); É
fundamental que deixe de fumar. (É uma
declaração assertiva se pronunciada por um
médico e o paciente lhe reconhecer autoridade.
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INDIRETOS |
Num ato ilocutório indireto, o locutor quer
dizer algo diferente daquilo que expressa em
sentido literal, contando com as capacidades
inferenciais do interlocutor para o
reconhecimento da sua intenção ou objetivo
ilocutório. Os enunciados «Passas-me
os talheres?»,
«Importas-te de
me passar o azeite?»,
ou «Pode
dizer-me como se chama este sítio?»,
apesar do seu formato interrogativo (que
poderiam realizar um ato ilocutório de
pergunta), devem antes serem entendidos como um
pedido (ato ilocutório indireto).
O mesmo
se passa com a frase «Será
que vocês gostariam de vir passar o
fim-de-semana comigo?»,
em que a pergunta realiza um convite.
Para a desmontagem do mecanismo dos atos
ilocutórios indiretos, o interlocutor recorre
ao que Grice denomina implicatura conversacional,
na qual intervém um conjunto de saberes
diferenciados, tais como os que se relacionam
com as informações enciclopédicas / conhecimento
do mundo (saber compartilhado), com o
conhecimento relativo aos atos ilocutórios e com
os princípios reguladores da interação
discursiva (princípio de cooperação, princípio
de cortesia).
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Joaquim
Matias da Silva
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